terça-feira, 16 de outubro de 2012

Wes Anderson e alguma coisa (pouca coisa, na verdade) sobre "Moonrise Kingdom"

Prometi a mim mesmo que ia voltar a este blog para escrever algo sobre Cosmópolis. É um grande filme, mas vai ficar para depois (ou para nunca mais, como a maioria das minhas promessas). O fato é que ainda estou em débito, preciso terminar o livro (e depois voltar ao filme); escrever sobre ele é tarefa ingrata e que talvez já tenha passado do ponto, afinal o filme já deve estar saindo de cartaz. Enfim, mesmo atrasado, voltarei a ele (ou não).

Eis que surge este "Moonrise Kingdom", que, ao lado de "Cosmópolis" e uns poucos outros, está entre os bons filmes deste fraco 2012. Escrever algo sobre Wes Anderson e seu Moonrise Kingdom me parece uma tarefa muito menos árdua. E já que tenho tempo de menos e preguiça de sobra, acho que essa é a melhor opção. Então, vamos a eles.



Ignoro completamente o que Wes Anderson fez antes de "Os excêntricos Tenenbauns" (2001) e isso talvez não importe tanto, porque foi a partir daí que Anderson de fato virou um diretor cultuado (estou dizendo isso com base no meu coração, no meu sentimento, não tem dado nenhum nisso, então posso estar redondamente enganado). O fato é que conheci o trabalho de Wes Anderson a partir daí. E não engolia esse cara nem ferrando, apesar de admitir que, em termos de humor, ele tinha lenha para queimar; nesse ponto o filme tinha lá algum interesse. O que me incomodava, e muito, era a necessidade que o filme tinha de parecer excêntrico, e tudo aquilo (dos figurinos aos movimentos de câmera) me soava como uma coisa meio metida a besta, uma enganação sem fim. Era muito artifício para pouco assunto. Depois veio "A vida marinha com Steve Zissou" (2004) e não mudei muito de opinião, inclusive continuava vendo certa originalidade humorística na abordagem de Anderson. A coisa muda de figura quando vi "Viagem a Darjeeling", que tinha uma bela história sobre três irmãos que faziam uma viagem pela Índia, que era sobretudo uma viagem de reconciliação. Ali, os artifícios de Anderson pareciam funcionar a favor do filme. Talvez fosse isso que faltasse a Wes Anderson, uma bela história. É o que se vê também em "O Fantástico Sr. Raposo", uma ótima animação de 2009, até hoje o filme de Anderson que mais me agradava. Aliás, até ontem, porque hoje é "Moonrise Kingdom" na cabeça.



Moonrise Kingdom parece reunir o que Wes Anderson tem de melhor, coisas que eu já tinha percebido a partir de "Viagem a Darjeeling" mas que me escaparam nos filmes anteriores. A história de Suzy e Sam é de uma beleza meio torta, e isso me ganhou logo de cara. O humor afiado é novamente um ponto muito forte e tudo é tratado com muita sensibilidade (e bastante ousadia), sem contar que é muito difícil resistir ao clima nostálgico do filme (aliás, todos os anteriores têm esse clima, mas aqui parece ser mais forte). É uma bela história de amor contada com muita originalidade. Vocês devem ter percebido que o que antes eu chamava de "artifício" agora estou chamando de "originalidade". Ainda estou sob o efeito do filme que, para mim, está quilômetros acima da média das comédias românticas feitas hoje em Hollywood. Saí do cinema com a sensação de que preciso voltar aos filmes mais antigos de Anderson. Posso estar errado (e normalmente estou), mas tenho a impressão de que estou prestes a redescobri-los agora que o preconceito (sim, acho que era puro preconceito) que eu tinha contra Wes Anderson finalmente foi quebrado. Minha nova promessa para este fim de ano (ou não).

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Algumas linhas sobre "On the road" e os "filmes de arte"

Mais uma tentativa de ressuscitar este blog. Se bem que ele nunca esteve vivo de fato. Então, trata-se de uma tentativa de recomeçá-lo. Não importa: o fato é que apaguei o que já tinha escrito, porque é impossível ler algo que você escreveu há anos e não se sentir envergonhado. Comecemos do zero (e para o nada; não estou muito seguro de que alguém esteja interessado no que vem a seguir, e isso também pouco importa). Segue o barco, deixando as lamentações de lado, sem maiores explicações.

Há pouco, fui ver "Na estrada" (On the road), de Walter Salles e fiquei com vontade de escrever algumas linhas a respeito. Sei que não é muito bom escrever algo sobre o filme no calor do momento, porque com certeza vou cometer algumas injustiças; mas essa é a graça da coisa e, de qualquer forma, as coisas injustas são muito mais legais. Enfim, o filme me fez pensar em algumas coisas que quero dividir.

A começar pelo cinema em si, que, em 2012, ao contrário dos anos anteriores, começou promissor, com alguns títulos muito interessantes, mas perdeu o fôlego e está se revelando bastante decepcionante. Explico: até mesmo o Oscar, que ultimamente vinha com listas de filmes intragáveis (com algumas exceções, claro), esse ano trouxe títulos bem consistentes, na minha opinião. Filmes como o Hugo Cabret do Scorsese, A árvore da vida e Os descendentes, para ficar em poucos exemplos, são realmente muito bons, e a lista, com poucas exceções, era de alto nível. Foi um começo animador, e ainda acho que 2012 tem sido muito menos tenebroso do que os anos anteriores. Porém, os filmes que eu mais aguardava se revelaram um tanto decepcionantes. Os títulos que eu considerava "quentes" este ano deixaram a desejar. Para dar uns exemplos, teve o Sombras da noite, que não achei ruim, mas revelou um Tim Burton meio que no piloto automático, e agora este On the road, do qual se dizem maravilhas, tanto do filme quanto do livro; e é sobre On the road que quero falar, porque acho que ele reflete muito do que sinto sobre a produção cinematográfica atual.



Esse filme do Walter Salles é impecável do ponto de vista técnico. É de encher os olhos, do primeiro ao último fotograma. Sam Riley e Garret Hedlund são grandes atores e foram muito bem dirigidos. Kristen Stewart é muito boa também. Ainda temos Kirsten Dunst, Amy Adams, Viggo Mortensen e Steve Buscemi, todos ótimos. A fotografia é uma beleza. As cenas mais fortes não são filmadas com o pudor típico do cinema mais comercial, o que é um alívio. Mas o que faz um filme desses não decolar? Não sei dizer ao certo, mas algumas coisas me vieram à mente durante a projeção. A primeira delas é o material no qual o filme se baseia: o livro de Jack Kerouac talvez não seja algo muito propício a ser filmado. Só que isso não tenho como afirmar porque não li o livro, mas até hoje poucos se meteram a filmar os textos desses caras da tal geração Beatnik, e não deve ser à toa. Sobre esse assunto, só tenho como fazer essa suposição não muito segura, então vou me ater ao filme.

O roteiro parece se arrastar e as situações lá pelas tantas acabam ficando um tanto repetitivas. Claro que muitos não vão achar isso e talvez esse nem seja o grande problema de On the road. Acho que o problema é outro, e é um problema comum aos chamados "filmes de arte" recentes, aos filmes de festivais. Os "filmes de estrada", que é o que On the road tenta ser, estão na minha memória como obras meio tortas, com situações que parecem meio que improvisadas e que acabam se revelando poéticas. Não é o que vemos aqui. No filme de Walter Salles se tenta ser poético a todo custo, se atira para todo lado claramente com essa intenção. O rigor formal do filme (que é justamente o problema que atribuo aos ditos "filmes de arte" atuais) atrapalha, e muito. Somos soterrados pela beleza estética do filme e prestamos mais atenção aos planos milimetricamente pensados, de tanto que estes chamam a atenção para si mesmos. E isso nos faz perder o interesse nas angústias de Sal, Dean e Marylou, que creio que deveria ser o que há de mais forte em On the road. Os filmes de estrada costumam deixar o espectador se sentindo sujo como seus personagens, totalmente identificados com eles. Durante a sessão, imaginei Walter Salles filmando On the road num terno indefectível, tamanha a elegância dos planos. Enquanto isso, o espectador passa ileso por tudo que é mostrado na tela. E, no meu caso, com uma amarga sensação de indiferença.

Apesar de tudo isso, vejam o filme e discutam comigo. Gosto da discordância. Já estou me preparando para as primeiras pedradas.